Há mais de um mês, o governo federal tenta, sem sucesso, mudar as regras na cobrança do IOF (Imposto sobre Operações Financeiras), sobre operações de crédito, câmbio, seguros e previdência privada – com o objetivo de reforçar a arrecadação e cumprir a meta de superávit primário de 0,25% do PIB em 2025. Afinal, nos dias 22 e 23 de maio, dois decretos do Poder Executivo foram publicados sobre o tema. O primeiro impôs nova regulamentação, anunciando aumento do tributo, e o segundo, com um certo recuo, revendo algumas das alterações.

O governo vem buscando alterar as alíquotas do IOF para aumentar a arrecadação e, dessa forma, cumprir a meta fiscal de 2025. A expectativa inicial era arrecadar R$ 20 bilhões ainda em 2025 e R$ 41 bilhões em 2026.
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No dia 11 de junho, o governo publicou um terceiro decreto, novamente com o objetivo de aumentar o tributo, com revisões. Todavia, a reação foi imediata: em 25 de junho, o Congresso derrubou o decreto por meio de um Projeto de Lei, em votação histórica (383 a 98 na Câmara), invalidando a medida.
A nova fase chegou com a decisão do governo de judicializar a questão. Na última terça-feira (1), o advogado-geral da União, Jorge Messias, encaminhou ao Supremo Tribunal Federal (STF) uma ação pedindo que o veto do legislativo seja declarado inconstitucional. Para ele, a derrubada do decreto viola o princípio da separação de Poderes.
O que deseja o governo federal?
O decreto do governo federal previa a unificação do IOF sobre operações de câmbio de 3%. A medida incluía compras internacionais, compras internacionais em espécie, gastos em cartões pré-pagos internacionais, cheques de viagens para gastos pessoais e empréstimos externos para operações com prazo inferior a 365 dias. Com a derrubada da regra, a compra em moeda em espécie voltou a ter IOF de 1,1% e as demais transações em 3,38%.
Por outro lado, remessas internacionais foram isentas no caso de entradas de divisas no Brasil e cobradas em 3,5% no caso de envio de recursos para fora do país. Agora, ambas as transações voltam a ter uma alíquota única de 1,1%.
Para as empresas, o decreto proposto pelo governo previa um teto de 3,35% de IOF ao ano em operações de crédito. O veto fez a alíquota retornar a 1,88% ao ano. Para optantes do Simples Nacional, a cobrança por crédito havia passado para 1,95% ao ano, mas retornou para 0,88% anuais.

Na previdência privada VGBL (Vida Gerador de Benefício Livre), o governo federal havia proposto isenção para aportes de até R$ 25 mil mensais em 2025 e de até R$ 50 mil mensais em 2026, com a cobrança de 5% para valores excedentes. Após a queda da regra, o VGBL voltou a ser isento para aportes mensais de qualquer valor.
No decreto de 11 de junho, não foram alteradas as regras para operações interbancárias, importação e exportação, ingresso e retorno de recursos de investidor estrangeiro, remessa de dividendos e juros sobre capital próprio para investidores estrangeiros.
Posição do Congresso sobre aumento do IOF
Presidente do Senado, Davi Alcolumbre fez questão de fazer uma avaliação sobre o que ocorreu com a nova tentativa do governo de cobrar mais IOF para compensar as perdas de receita com a isenção do imposto de renda para quem recebe até R$ 5 mil e contribuir para o equilíbrio fiscal do país. Davi disse que a votação foi uma derrota para o governo. Mas sinalizou com a possibilidade de construção de um novo acordo. Pediu que haja maior diálogo com o Parlamento, que, segundo ele, vem apoiando a política econômica do atual governo, desde o início. E criticou o decreto governamental.
“Esse decreto começou mal. O governo editou um decreto que foi rapidamente rechaçado pela sociedade brasileira. E reconheço que, muitas das vezes, sem entender o que é o decreto do IOF, muitos daqueles que foram colocados contrários nem tinham conhecimento do que estava escrito nele. Agora é a hora de todos nós pararmos, conversarmos mais, construirmos as convergências e o que é necessário para o Brasil”, declarou.

O relator no Senado, Izalci Lucas (PL-DF), apresentou parecer favorável ao substitutivo aprovado na Câmara ao projeto legislativo original (PDL 314/2025), impedindo o aumento do IOF. O parlamentar criticou o uso do tributo para aumentar a arrecadação, uma vez que, de acordo com a Constituição, ele deveria ser apenas um imposto regulatório.
“Estamos falando de um imposto que deveria ter função regulatória, mas que vem sendo usado de forma oportunista para aumentar arrecadação sem debate com o Congresso. Isso compromete a confiança dos agentes econômicos, afasta investimentos e penaliza os mais vulneráveis. O país precisa de previsibilidade, não de improvisos tributários que só ampliam a insegurança e a desigualdade”, disse Izalci.
Na opinião do senador Ciro Nogueira (PP-PI), líder da Minoria, é possível cortar despesas em um orçamento federal que ultrapassa R$ 1 trilhão em vez de aumentar tributos. Ele defendeu que o Congresso precisava enviar um sinal claro à sociedade.
“Essa votação não é contra o governo, é a favor da sociedade brasileira. Nós temos uma carga tributária de país de primeiro mundo com serviços de segundo e terceiro mundo. Não é possível que, num orçamento de mais de R$ 1 trilhão, não se encontre o que cortar. O povo não aguenta mais pagar imposto – e isso precisa ser dito, para este e para qualquer futuro governo”.
STF derruba decretos
Na última sexta-feira (4), o Supremo Tribunal Federal (STF) suspendeu os decretos do presidente Lula (PT), que aumentavam o IOF. Assim, ratificam, temporariamente, a decisão do Congresso, que já havia derrubado os despachos presidenciais e retomado as alíquotas do imposto definidas em 2007. O ministro Alexandre de Morais também suspendeu o decreto do Legislativo, que derrubou os despachos do Executivo.
“Morais suspendeu os dois decretos do governo e o decreto legislativo que anulava os do governo. “O ministro do STF reconheceu que o IOF pode ser alterado por decreto presidencial, mas disse que os limites constitucionais exigem que as mudanças tenham finalidade extrafiscal e não arrecadatória. Como o próprio governo declarou que o objetivo era aumentar a arrecadação em quase R$ 40 bilhões, há indícios de desvio de finalidade”, destaca a tributarista Bruna Fagundes, do escritório Briganti Advogados, ao “Uol”.

Ainda de acordo com a advogada, o decreto do Congresso que suspendeu os de Lula também seria ilegal.
“Moraes afirmou que a medida feriu a Constituição ao extrapolar a competência do Congresso de sustar atos normativos do Executivo. Segundo o ministro, havendo possível inconstitucionalidade nos decretos presidenciais, caberia ao Judiciário analisar a questão”, afirmou.
Na próxima terça-feira (15), haverá uma reunião convocada por Alexandre de Moraes. Até lá, integrantes do governo e do Congresso tentarão fechar um acordo na sala de audiências do Supremo. Se o encontro não for suficiente para resolver a divergência, caberá ao STF decidir se os decretos presidenciais serão derrubados ou se voltarão a valer