Os caiçaras formam um grupo tradicional de comunidades que vivem no litoral do Brasil, principalmente em regiões entre o sul do estado do Rio de Janeiro e o norte de Santa Catarina. No Rio de Janeiro, essas populações estão presentes em diversos municípios costeiros, preservando saberes ancestrais, modos de vida sustentáveis e uma relação direta com a terra, o mar e a floresta.
Nesta matéria, vamos explorar quem são os caiçaras fluminenses, onde estão localizados, quais são seus desafios atuais e como suas práticas culturais e econômicas têm resistido à urbanização acelerada e à pressão imobiliária. Com base em estudos acadêmicos, dados oficiais e entrevistas com especialistas e representantes das comunidades, o texto oferece um panorama completo para entender a importância dos caiçaras para o patrimônio cultural e ambiental do estado do Rio de Janeiro.
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Quem são os caiçaras?
Os caiçaras são descendentes da mistura entre indígenas, africanos e colonizadores europeus. Seu modo de vida tradicional é baseado na pesca artesanal, na agricultura de subsistência, no extrativismo vegetal e no artesanato. A palavra “caiçara” tem origem tupi e originalmente designava as cercas de galhos usadas para prender peixes, mas com o tempo passou a identificar os habitantes tradicionais do litoral.
Segundo a antropóloga Manuela Carneiro da Cunha, “os caiçaras representam um dos grupos mais expressivos da interação entre sociedade e natureza no Brasil. Sua cultura é marcada pela sabedoria popular e pela convivência harmoniosa com o meio ambiente”.
Apesar de não serem formalmente reconhecidos como povos indígenas ou quilombolas, os caiçaras têm lutado por reconhecimento jurídico como comunidades tradicionais, o que lhes garante direitos territoriais e acesso a políticas públicas específicas.
Onde estão os caiçaras no estado do Rio de Janeiro?
No Rio de Janeiro, os caiçaras estão concentrados principalmente em regiões como:
- Paraty: é uma das cidades com maior presença caiçara, com várias comunidades costeiras que mantêm tradições de pesca, cultivo de mandioca e festas populares como a Festa do Divino.
- Angra dos Reis: abriga dezenas de comunidades caiçaras espalhadas por ilhas e enseadas, como a Vila do Provetá, Saco do Mamanguá e Araçatiba.
- Ubatuba (divisa com SP, mas parte da cultura caiçara fluminense): compartilha elementos culturais com os caiçaras fluminenses.
- Ilha Grande: com várias vilas tradicionais como Abraão, Palmas e Aventureiro, muitas das quais acessíveis apenas por barco.
- Região dos Lagos (Arraial do Cabo e Cabo Frio): embora mais urbanizadas, ainda concentram pescadores artesanais e manifestacões culturais caiçaras, como o fandango e os mutirões.
Cultura e modos de vida caiçaras
A cultura caiçara é fortemente ligada à natureza. A pesca artesanal, com uso de canoas de um só tronco (canoa de várzea), tarrafas e redes, é uma das principais atividades econômicas. A agricultura familiar é voltada para o cultivo de mandioca, milho, banana e outras frutas tropicais.
As casas são feitas com técnicas tradicionais como pau-a-pique e cobertas de sapé. O artesanato com fibras vegetais, a culinária baseada em peixes e frutos do mar, e a oralidade nas histórias e lendas fazem parte do cotidiano.
Festas religiosas e culturais também têm papel central na identidade caiçara. As mais conhecidas incluem:
- Festa do Divino;
- Folia de Reis;
- Procissões Marítimas;
- Fandango Caiçara (reconhecido como Patrimônio Cultural do Brasil pelo IPHAN);

Desafios enfrentados pelas comunidades
Apesar da riqueza cultural, os caiçaras enfrentam ameaças constantes:
- Pressão imobiliária: em regiões valorizadas turisticamente, comunidades são expulsas de seus territórios para dar lugar a condomínios de luxo e resorts.
- Restricções ambientais: a criação de unidades de conservação sem consulta prévia impacta o modo de vida tradicional, proibindo a pesca, agricultura ou construções.
- Falta de reconhecimento jurídico: sem o reconhecimento formal como comunidades tradicionais, os caiçaras têm dificuldade em acessar políticas de regularização fundiária.
Segundo o Instituto Socioambiental (ISA), muitas dessas comunidades vivem em territórios ancestrais, mas não têm posse legal da terra, o que as torna vulneráveis a despejos.
Resistência e organização social
Nos últimos anos, os caiçaras têm se articulado por meio de associações, cooperativas e redes de apoio, como a Rede Caiçara, que atua na defesa dos direitos territoriais, culturais e ambientais dessas populações.
Projetos como o “Observatório Caiçara”, vinculado à Universidade Federal Fluminense (UFF), ajudam a dar visibilidade a essas questões e a documentar a história e tradições das comunidades.
De acordo com Carlos Alberto Rodrigues, morador da comunidade do Saco do Mamanguá, “a resistência é no dia a dia. Continuar pescando, celebrando nossas festas e ensinando nossas crianças já é um ato de resistência.”
Caminhos para a preservação
Diversas iniciativas têm buscado garantir os direitos dos caiçaras, como:
- Processos de reconhecimento como comunidades tradicionais pelo governo federal e estadual;
- Educação intercultural, com escolas que respeitam e valorizam o saber local;
- Turismo comunitário como alternativa de renda, com roteiros sustentáveis conduzidos pelos próprios moradores;
- Mapeamento participativo dos territórios caiçaras, como ferramenta de defesa legal e cultural.

Os caiçaras do Rio de Janeiro representam uma parte essencial da diversidade cultural e ecológica do Brasil. Com saberes passados de geração em geração, resistem às adversidades e mantêm viva uma relação ancestral com a natureza.
Para garantir sua permanência e valorização, é fundamental que o poder público reconheça seus direitos, promova políticas específicas e inclua os caiçaras na construção de um futuro mais justo, diverso e sustentável.