Com a popularização dos smartphones com câmeras de alta qualidade e o crescimento das redes sociais, fotografar cenas do cotidiano se tornou uma prática comum. Mas, afinal: posso fotografar aqui? Esta dúvida é mais frequente do que parece e envolve questões legais sobre privacidade, propriedade, uso de imagem e segurança.
O Brasil possui legislações específicas que regulamentam a fotografia em espaços públicos e privados. Saber os limites e os direitos do fotografo é essencial para evitar problemas legais, processos judiciais ou conflitos interpessoais.
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O que diz a lei brasileira sobre fotografia?
Não existe uma “Lei da Fotografia” específica no Brasil, mas diversas normas do Código Civil, do Código Penal e da Constituição Federal tratam indiretamente do assunto. Entre os principais dispositivos está o Artigo 5º da Constituição Federal, que garante a inviolabilidade da vida privada, da honra e da imagem das pessoas.
Já o Código Civil (art. 20) determina que o uso da imagem de uma pessoa pode ser proibido caso lhe cause prejuízo moral ou material. Isso significa que, mesmo em espaços públicos, fotografar uma pessoa sem autorização pode gerar implicações legais.
“A liberdade de expressão e o direito de registrar imagens não podem sobrepor o direito à privacidade. O bom senso e o respeito devem guiar o ato de fotografar”, alerta a advogada Renata Mota, especialista em direito digital e privacidade de dados.
Espaço público x espaço privado de uso público
Um dos grandes equívocos é considerar que todo espaço acessível ao público é um espaço público. Praças, calçadas e ruas, por exemplo, são locais públicos, onde é permitido fotografar sem autorização prévia. Porém, shoppings, aeroportos, estações de metrô, hospitais e escolas, embora abertos ao público, são espaços privados de uso coletivo e, portanto, estão sujeitos a regras próprias.
Cada local pode ter políticas internas que proíbam ou limitem a captação de imagens. O descumprimento dessas regras pode resultar em advertências ou até mesmo em ações legais por parte dos administradores do espaço.
Direitos autorais e uso de imagem
A Lei de Direitos Autorais (Lei nº 9.610/1998) protege o fotografo como autor da imagem captada. Isso significa que a fotografia é uma obra intelectual e pertence a quem a produziu. Por outro lado, a imagem das pessoas retratadas também é protegida por lei.
Se a imagem de uma pessoa for utilizada de forma comercial, para divulgação ou fins publicitários, é obrigatória a autorização por escrito. Caso contrário, o autor da foto pode ser responsabilizado civilmente.
“Captar uma imagem é diferente de publicá-la. Mesmo em espaços públicos, o uso da imagem de terceiros exige cuidado. O consentimento é sempre o melhor caminho”, reforça a professora de Direito Civil da USP, Dra. Laura Barros.
O que pode e o que não pode ser fotografado?
Pode fotografar:
- Paisagens naturais, ruas, monumentos e prédios públicos (exceto se houver restrição expressa);
- Pessoas em espaços públicos, desde que não estejam em situação constrangedora e a imagem não seja explorada comercialmente;
- Eventos públicos ao ar livre (shows, protestos, manifestações);
- Obras de arte em espaços abertos e permanentes (como esculturas em praças), respeitando os direitos autorais.
Não pode fotografar (sem autorização):
- Pessoas em situação de vulnerabilidade (moradores de rua, crianças, pacientes em hospitais);
- Órgãos públicos com restrição de segurança (como tribunais, bases militares, delegacias);
- Ambientes privados de uso coletivo com sinalização que proíba fotografias;
- Crianças e adolescentes, sem o consentimento dos pais ou responsáveis legais.

E quanto à fotografia profissional?
Para trabalhos profissionais, como ensaios fotográficos, produções de moda, campanhas ou filmagens, mesmo em locais públicos, pode ser necessária uma autorização da prefeitura ou do órgão responsável. Muitas cidades exigem licenciamento específico para atividades com equipamentos profissionais ou equipe de produção.
Além disso, se houver interdição de vias, uso de drones ou alteração da rotina do local, o licenciamento é indispensável.
Fotografar é invadir a privacidade?
A privacidade é um direito garantido. Mesmo em espaços públicos, é preciso bom senso. Fotografar alguém de forma invasiva, sem autorização e em situação comprometedora, pode configurar infração civil e até criminal.
Casos recentes, como o da influenciadora que fotografou uma mulher em um vestiário e publicou sem permissão, mostram como o ato de fotografar pode extrapolar os limites legais. A exposição indevida é passível de indenização por danos morais.
E quanto ao uso de drones?
O uso de drones é regulamentado pela ANAC (Agência Nacional de Aviação Civil) e também pela ANATEL. Para operações com drones acima de 250g, é obrigatório registro, seguro com cobertura de danos a terceiros e autorização para sobrevoo de pessoas.
A captação de imagens com drones também está sujeita às leis de privacidade. Filmagens de residências, áreas privadas ou pessoas em situações vulneráveis podem ser consideradas invasão de privacidade.
Casos emblemáticos e jurisprudências
Tribunais brasileiros têm julgado diversos casos de uso indevido de imagem, especialmente em redes sociais. Em 2022, o Tribunal de Justiça de São Paulo condenou uma empresa a pagar R$ 15 mil a uma funcionária cuja imagem foi utilizada sem consentimento em uma campanha interna.
“Mesmo sem fins comerciais, o uso indevido da imagem pode configurar dano moral. O consentimento é a regra de ouro”, ressalta o jurista Marcelo Figueiredo, professor da PUC-SP.
Boas práticas para quem gosta de fotografar
- Peça permissão sempre que possível, especialmente ao fotografar pessoas;
- Evite registros de crianças sem autorização dos pais;
- Leia as regras do local, principalmente em espaços como museus, galerias, shoppings ou igrejas;
- Não fotografe em vestiários, banheiros ou ambientes de intimidade;
- Utilize legendas respeitosas ao publicar fotos nas redes sociais;
- Para fins comerciais, tenha termos de autorização de imagem assinados.

Fotografar é uma forma poderosa de expressão, arte e documentação da realidade. No entanto, o direito de registrar imagens vem acompanhado da responsabilidade de respeitar o outro. Conhecer os direitos de fotografia em espaços públicos e privados é fundamental para garantir uma prática segura, ética e legal.
Antes de perguntar “posso fotografar aqui?”, vale refletir: estou respeitando o local e as pessoas ao meu redor? Se a resposta for sim, o clique está liberado.