Roberto Jefferson, ex-deputado federal, ex-presidente do PTB e uma das figuras mais controversas da política brasileira contemporânea, teve uma trajetória que atravessa décadas, do jornalismo político à liderança partidária, do protagonismo em escândalos de corrupção à radicalização ideológica. Com papel central no escândalo do Mensalão em 2005 e, anos depois, protagonista de um dos episódios mais dramáticos da política recente ao reagir à prisão com tiros e uma granada, Jefferson tornou-se um símbolo da degradação do debate público e da violência política no Brasil.
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Início no jornalismo e a entrada na política
Antes de se tornar uma figura conhecida na Câmara dos Deputados, Roberto Jefferson iniciou sua carreira como jornalista na década de 1970, trabalhando em veículos como o jornal Luta Democrática, fundado por seu pai, e no Jornal do Brasil. Sua formação acadêmica em Direito também serviu de base para sua atuação na vida pública. Em 1982, foi eleito deputado federal pelo Rio de Janeiro, cargo que ocupou por sete mandatos consecutivos, até ser cassado em 2005.
Escândalo do Mensalão: a denúncia que mudou os rumos da política
Roberto Jefferson entrou definitivamente para a história política brasileira ao denunciar, em entrevista ao jornal Folha de S.Paulo em 2005, a existência de um esquema de compra de votos no Congresso Nacional. Segundo ele, parlamentares da base do governo Lula recebiam uma “mesada” mensal de R$ 30 mil para votar a favor dos projetos do Executivo. A declaração levou à abertura de uma CPI e ao escândalo que ficou conhecido como “Mensalão”.
A gravidade das acusações fez com que o Supremo Tribunal Federal abrisse investigação, culminando no julgamento da Ação Penal 470. Em 2012, Jefferson foi condenado a sete anos e quatorze dias de prisão pelos crimes de corrupção passiva e lavagem de dinheiro. Cumpriu parte da pena em regime fechado e o restante em domicílio, tendo sua pena extinta em 2016 pelo STF.
“Jefferson foi um divisor de águas. Ele expôs uma prática arraigada de corrupção, mas também participou dela”, resume o cientista político Marco Aurélio Nogueira, professor da UNESP.
Retorno à cena pública e radicalização ideológica
Mesmo após a condenação, Roberto Jefferson retomou protagonismo ao reassumir a presidência do Partido Trabalhista Brasileiro (PTB), buscando reposicionar a legenda no espectro da direita conservadora. Apoiado por grupos bolsonaristas, transformou-se em uma das vozes mais agressivas contra o Supremo Tribunal Federal e as instituições democráticas.
Sob sua liderança, o PTB passou a divulgar manifestações que flertavam com o autoritarismo e o discurso antidemocrático. Em diversas ocasiões, Jefferson utilizou as redes sociais para atacar ministros do STF, como Alexandre de Moraes e Carmen Lúcia, sendo alvo de inquéritos que apuram a disseminação de fake news e atos antidemocráticos.

Prisão por ataques às instituições
Em agosto de 2021, Jefferson foi preso por determinação do ministro Alexandre de Moraes, no âmbito do inquérito das milícias digitais. A Polícia Federal apontou que o ex-deputado fazia parte de uma rede que incitava a população contra o Estado Democrático de Direito. Durante sua prisão domiciliar, Jefferson descumpriu medidas judiciais ao conceder entrevistas e manter atividades nas redes sociais.
Em outubro de 2022, ao receber nova ordem de prisão por violar as condições da domiciliar, Jefferson protagonizou um dos momentos mais chocantes da história recente. Em sua residência em Comendador Levy Gasparian (RJ), reagiu à chegada de agentes da PF com tiros de fuzil e o lançamento de duas granadas, ferindo dois policiais. O caso teve ampla repercussão nacional e internacional.
“Foi uma ação de extrema gravidade. Um ataque direto às forças de segurança do Estado por um ex-parlamentar é inédito na história brasileira contemporânea”, afirmou o ex-ministro da Justiça José Eduardo Cardozo.
Aliado de Bolsonaro e o embate com o STF
Durante o governo Jair Bolsonaro, Jefferson tornou-se aliado do ex-presidente, compartilhando narrativas contra o Supremo Tribunal Federal e o sistema eleitoral. A relação, porém, esfriou após o ataque à PF, quando Bolsonaro classificou a reação do ex-deputado como “inaceitável”. Ainda assim, Jefferson seguiu como figura de referência para grupos extremistas.
Seu comportamento motivou uma série de ações por parte da Justiça. Em 2023, o Supremo manteve sua prisão preventiva. No mesmo ano, o Tribunal Superior Eleitoral (TSE) decidiu por unanimidade tornar Jefferson inelegível até 2030, com base na Lei da Ficha Limpa.
Repercussão e impacto político
As atitudes de Roberto Jefferson têm gerado intensos debates sobre os limites da liberdade de expressão, a responsabilização de lideranças políticas e os riscos da radicalização no ambiente democrático. Em nota oficial, a Associação dos Magistrados Brasileiros (AMB) classificou o ataque à PF como “inadmissível e repulsivo”.
A cientista política Beatriz Vargas, da Universidade de Brasília, avalia que “Jefferson representa um sintoma da crise institucional vivida pelo Brasil. Ele simboliza a transição de uma oposição tradicional para a insurgência antidemocrática”.

Com uma carreira que mistura protagonismo parlamentar, escândalos de corrupção, discursos incendiários e violência explícita, Roberto Jefferson se tornou um personagem que reflete os extremos da política nacional. Sua trajetória evidencia os desafios enfrentados pelas instituições democráticas diante da ascensão de discursos autoritários e da banalização da violência no debate público.
O caso de Jefferson segue sendo acompanhado por juristas, acadêmicos e observadores internacionais como um exemplo emblemático dos limites entre discurso político e crime, liberdade e responsabilidade, democracia e autoritarismo.