A segurança pública está entre as maiores preocupações dos brasileiros, figurando como uma das principais pautas em pesquisas de opinião. Com o avanço da Proposta de Emenda à Constituição (PEC) da Segurança Pública no Congresso Nacional, o tema volta com força ao centro das discussões políticas e sociais. Mas, afinal, o que está em jogo com essa proposta? E como ela pode impactar a vida do cidadão comum?
Neste artigo, vamos explicar em detalhes o que é a PEC da Segurança Pública, o que propõe, os argumentos favoráveis e contrários, e por que essa discussão é tão importante para o Brasil de hoje.
Veja também:
- O Papel das políticas públicas na promoção da segurança cidadã
- Poder Executivo: funções, relações e influência na política brasileira
- O impacto das políticas educacionais para os brasileiros: o que mudou nos últimos anos?

O que é a PEC da Segurança Pública?
A PEC da Segurança Pública é uma proposta de emenda à Constituição que visa modificar regras relativas à estrutura, funcionamento e autonomia das forças policiais brasileiras, especialmente as Polícias Militares e Civis dos estados e do Distrito Federal.
A proposta vem sendo debatida há anos, com diferentes versões e nomes, mas a versão mais recente e mais polêmica é a PEC 3/2023, de autoria do senador Licenciado Flávio Bolsonaro (PL-RJ), que tramita no Senado e conta com apoio da bancada da segurança pública.
O texto propõe conceder maior autonomia às polícias, incluindo prerrogativas como:
- Mandatos fixos para comandantes-gerais das PMs;
- Vedação à remoção imotivada de delegados;
- Autonomia administrativa, orçamentária e funcional das corporações;
- Criação do Sistema Nacional de Segurança Pública como política de Estado, com regras uniformes em todo o país.
Na prática, a proposta busca fortalecer as polícias estaduais e padronizar suas estruturas, dando mais estabilidade aos cargos de comando e menos influência direta de governadores nos comandos das forças de segurança.
Por que a PEC é tão polêmica?
A PEC da Segurança Pública gerou forte repercussão no meio jurídico, político e acadêmico por levantar preocupações sobre o equilíbrio entre o poder civil e as forças armadas estaduais. Uma das principais críticas é que a medida pode abrir brechas para a militarização da política e redução da autoridade dos governadores, que constitucionalmente são os chefes das polícias em seus estados.
De acordo com o ex-ministro do Supremo Tribunal Federal (STF), Celso de Mello, a proposta “compromete a autoridade civil e pode gerar riscos para a democracia, ao transformar as polícias em instituições autônomas sem controle externo suficiente”.
Outro ponto crítico envolve o risco de politização ainda maior das polícias. Como lembra o jurista e professor da FGV, Oscar Vilhena Vieira, “o Brasil vive hoje um momento delicado, com setores das polícias sendo instrumentalizados politicamente. Dar mais autonomia pode aprofundar essa crise de autoridade”.
Argumentos a favor da PEC
Por outro lado, defensores da PEC argumentam que a proposta dá dignidade institucional às polícias, que muitas vezes são alvo de interferência política. O senador Flávio Bolsonaro, autor da PEC, afirma que “não se trata de tirar o poder dos governadores, mas de garantir que as polícias tenham estabilidade para planejar políticas de longo prazo, sem o risco de troca a cada eleição”.
A proposta também visa valorizar a carreira policial, evitar perseguições políticas a delegados e comandantes e garantir eficiência na aplicação de políticas públicas de segurança.
Segundo o coronel reformado da PM de São Paulo, José Vicente da Silva Filho, especialista em segurança pública, “uma estrutura mais estável e técnica pode melhorar os índices de criminalidade, dar continuidade a projetos eficazes e reduzir o improviso na segurança”.

Qual o impacto direto para o cidadão?
A resposta depende de como a PEC será regulamentada e aplicada na prática. Em teoria, se bem implementada, a proposta poderia:
- Garantir continuidade em políticas públicas de segurança, evitando trocas frequentes por critérios políticos;
- Valorizar o trabalho dos policiais, o que pode refletir em mais motivação e eficiência;
- Fortalecer o combate à criminalidade por meio de padronização e integração das forças estaduais com um sistema nacional.
Por outro lado, sem os devidos mecanismos de controle e fiscalização, a PEC pode abrir caminho para:
- Maior risco de politização das forças de segurança;
- Conflitos entre governos estaduais e comandos policiais;
- Desrespeito a princípios democráticos, caso as polícias passem a atuar de forma independente de políticas públicas civis.
O que dizem as instituições e especialistas?
A proposta já recebeu nota de alerta do Fórum Brasileiro de Segurança Pública (FBSP), entidade de referência no setor, que destaca os riscos à governabilidade e à transparência das polícias.
Em documento oficial, o FBSP afirma que “a criação de mandatos fixos para comandantes de polícias militares pode engessar a atuação do poder executivo e dificultar a responsabilização em casos de violações de direitos humanos”.
O Conselho Nacional dos Chefes de Polícia Civil também demonstrou preocupação com a ingerência federal sobre corporações estaduais, o que poderia ferir o pacto federativo.
Já o Ministério da Justiça e Segurança Pública, sob comando do ministro Ricardo Lewandowski, indicou que o governo federal monitora com cautela o avanço da PEC, e que mudanças estruturais em forças armadas e de segurança exigem “amplo debate nacional com especialistas, juristas, governadores e a sociedade civil”.
Qual o cenário de aprovação?
Atualmente, a PEC está em fase de análise no Senado, e ainda precisa passar por comissões temáticas antes de ir ao plenário. Caso seja aprovada por pelo menos 49 dos 81 senadores, seguirá para a Câmara dos Deputados, onde também precisará de 308 votos favoráveis em dois turnos.
Embora o clima político no Congresso favoreça a pauta da segurança pública, há resistência de governadores, juristas e organizações de direitos humanos. A tendência é que a proposta passe por ajustes e negociações antes de qualquer votação definitiva.
Um debate que vai além da PEC
A discussão sobre a PEC da Segurança Pública expõe uma ferida crônica do país: o modelo de segurança pública brasileiro. Baseado em uma lógica militarizada e fragmentada, o sistema atual enfrenta desafios como:
- Baixos índices de resolução de homicídios (apenas 44% são solucionados, segundo o Instituto Sou da Paz);
- Altas taxas de letalidade policial;
- Falta de integração entre forças policiais e sistema judiciário;
- Baixos investimentos em inteligência e prevenção.
A PEC reacende a necessidade de um debate mais amplo: como construir uma política de segurança pública eficaz, democrática e respeitosa aos direitos humanos?

A PEC da Segurança Pública representa mais do que uma simples mudança na Constituição. Trata-se de um momento decisivo para o futuro da segurança pública no Brasil. Entre o desejo legítimo de dar estabilidade e autonomia às polícias e o risco de fragilizar o controle civil sobre as forças armadas estaduais, está o cidadão, que espera uma coisa: viver com mais segurança, justiça e paz.
Como todo tema estrutural, a PEC exige debate qualificado, transparência e participação da sociedade civil. Afinal, segurança pública não é apenas uma questão de polícia — é uma questão de Estado, de direitos e de cidadania.